Minhas teorias

Não minta para seu filho

Eder Cachoeira
Escrito por Eder Cachoeira em 28 de março de 2016

Constantemente, presencio muitos pais “chantageando” seus filhos para conseguir com que as crianças façam o que eles querem. Eu mesmo já fiz isso algumas vezes. :-/

Confira alguns exemplos e veja se você também faz ou fez algo parecido:

“Filho, se você não for tomar banho agora, não vai brincar depois”;
“Se não escovar os dentes, não vai passear”;
“Se você não levantar agora para ir pra escola, vai ficar sozinho em casa”;
“Se você não obedecer a mamãe, vai ficar de castigo”.

Às vezes ainda cometo erros assim, mas já faz tempo que me policio em relação a este tipo de comportamento. Por isso, gradativamente, tenho obtido bons resultados em relação à educação do meu filho.
Muitos pais não percebem, mas estão ensinando seus filhos a fazer algo esperando alguma coisa em troca. E isto não é bom.
O mais grave, na minha opinião, não é a “chantagem” em si, mas o fato de você não cumprir a “ameaça”. O ideal é você não utilizar este método para conseguir que seu filho realize as tarefas que ele deve fazer.
Uma vez que seu filho percebe (e ele percebe) que você fala essas coisas apenas para conseguir com que ele faça algo que você quer, ele vai começar a não te levar a sério. Isso faz com que seu esforço seja cada vez maior e cada vez menos eficaz.
Mais grave ainda é que, a partir de uma certa idade, seu filho também vai começar a te ”chantagear” para conseguir o que quer. Ou seja, você ensinou ele a não acreditar nas suas “ameaças” e ensinou ele a te ameaçar quando você não fizer o que ele quer. Isto é fato!

“Ameaças” não cumpridas são mentiras. E mentiras são ruins para a educação de uma criança.

Veja o seguinte exemplo: você sai para viajar com seu marido (ou esposa) e seu filho de 4 anos (poderia ser uma criança de qualquer outra idade) para visitar os avós, que moram em outro estado. A viagem deve durar em torno de 6 horas.
Durante o caminho, seu filho, impaciente, sentado na cadeirinha e “amarrado” pelo cinto de segurança, pergunta: “Pai, falta muito pra gente chegar?” e você responde: “Não filho, falta pouco. Estamos quase chegando”. Porém, vocês ainda estão na metade do caminho e você disse isso porque já é a quarta vez que seu filho pergunta. Em outras palavras, você mentiu para fazer seu filho não perguntar mais “quanto tempo falta, papai?”.

Querendo você ou não, seu filho (a partir de uma certa idade) já tem noção de tempo e espaço, por isso, ele também vai começar a entender que a informação que você passou não é verdadeira, e pronto, menos 1 ponto para você.

Ao invés de tentar fazer com que seu filho não repita a mesma pergunta várias vezes, tento induzi-lo a fazer perguntas diferentes ao longo do percurso, ensinando coisas novas a ele como, por exemplo, interpretar as placas de trânsito, os sinais de troca de direção que os veículos emitem, as faixas de divisão de pistas, as marcas e modelos dos outros carros, o nome das cidades e bairros que vocês atravessarem, as partes internas do seu carro, entre outras coisas. Isso fará com ele desvie a atenção sobre o tempo e valorize outros aspectos da viagem. E o mais importante: você não vai precisar mentir sobre o quanto falta para chegar ao seu destino.
As armadilhas da “mentira” não param por aí. Vamos supor que vocês chegaram ao destino, ou seja, na casa dos avós do seu filho, dentro do previsto.
Chegando lá, vocês precisam tomar um bom banho, descansar um pouco e alimentar-se. Só que seu filho também está cansado, e tanto quanto irritado por ter ficado “preso” durante 6 horas dentro do carro (mesmo com as técnicas de aprendizado que citei acima), e decide não tomar banho, pois ele quer brincar e matar as saudades dos avós.
Mas você, como mãe (ou pai), insiste que ele tome banho naquele momento, para ficar pronto para o jantar, pois já é tarde da noite.
Para tentar conseguir com que seu filho aceite o banho, você “ameaça”, dizendo que “se não tomar banho, não vai ganhar os presentes que o avô comprou pra ele”, ou, “se tomar banho vai sair pra passear no shopping”, ou ainda, “se recusar tomar o banho naquele momento, vai apanhar”.

Existem dois erros neste contexto: a “ameaça” e a “mentira”.

Mesmo que cumpra suas “ameaças” caso ele não concorde em tomar banho, está, novamente, ensinando seu filho a realizar uma tarefa em troca de alguma coisa.
O problema não é exatamente realizar uma tarefa em troca de algo, mesmo porque quando crescemos, nós geralmente trabalhamos em troca de uma remuneração ou algo parecido. O problema é transformar tarefas que não deveriam ser remuneradas em tarefas remuneradas, ou seja: “para tomar banho, eu ganho algo em troca”; “para escovar os dentes, eu ganho algo em troca”; “para estudar e tirar notas boas na escola, eu ganho algo em troca”.
Tente fazer seu filho entender que este tipo de tarefa não terá uma recompensa externa, que ele não ganhará (ou perderá) alguma coisa para executá-la. Tomar banho, escovar os dentes, estudar e tirar boas notas são tarefas que devem ser executadas para o benefício dele próprio: ele deve tomar banho para ficar limpo, cheiroso, saudável, para que as outras pessoas também gostem de ficar perto dele, etc. Ele deve escovar os dentes para não ficar com cheiro ruim na boca, para não ficar banguela, para não ficar doente, para que as pessoas gostem de conversar com ele. Ele deve estudar e tirar notas boas para não ficar atrasado em relação aos coleguinhas, para ajudar outros alunos que tenham dificuldade de aprender, para conseguir um bom trabalho no futuro (ou criar uma empresa), para ele não se sentir desvalorizado, para ser feliz!

De certa forma, são argumentos apelativos, mas não são “mentiras” e nem “ameaças”. São apenas maneiras diferentes de você conseguir que seu filho faça as coisas que você considera boas para ele.

Mais uma coisa super importante: tente também não perguntar se o seu filho “quer” fazer estas tarefas, ou seja, ao invés de falar, “Filho, vamos tomar bando?”, “Filho, quer almoçar?”, “Filho, porque você não faz a tarefa agora?”, diga, “Filho, está na hora do seu banho, suas roupas já estão na cama. Assim que você terminar o banho, vamos jantar, fazer suas tarefas e, em seguida, assistir àquele filme que você tanto queria ver, ou, se preferir, podemos jogar aquele game que você gosta. Beijo filho, já estou quase terminando o jantar”. Algo deste tipo.
Desta maneira, ele não irá focar no banho “chato”, e sim no filme ou no game. O banho, jantar, tarefas, ao invés de serem obstáculos, agora são etapas.
E se, mesmo assim, ele não quiser tomar banho, você continua sua rotina normalmente e deixa claro que a sequência que você “sugeriu” são pré-requisitos para a diversão. Mas não “ameace”, apenas deixe claro que a escolha é dele. Se ele fizer o que você sugeriu, ele terá benefícios. Explique que estes “benefícios” não são recompensas pelas tarefas cumpridas, mas conquistas que ele mesmo alcançará por se esforçar na execução das tarefas.
Vou contar um breve relato: meu filho também se “amarra” para tomar banho. Pior que isso, era a “amarração” para lavar o cabelo. Mesmo eu explicando como fazer para não arder os olhos, para ser rápido, ele chorava, ficava enrolando, demorava bastante, e isso me irritava.
Resolvi usar uma estratégia diferente: ao invés de ficar tentando convencê-lo em fazer do jeito que eu ensinei, eu pedi pra ele me ensinar um jeito diferente. Foi aí que ele se empolgou e inventou um jeito novo, que não era o meu jeito (sem sucesso) e nem o dele (chorando e demorando). Ele se empolgou tanto em me ensinar, que esqueceu o medo dos olhos ardendo e também não fica mais “enrolando” embaixo do chuveiro.
Resultado: Sem irritação nos olhos, sem discussões, sem demora, sem estresse.

Se você está tentando lidar com uma situação e a maneira que você escolheu não dá o resultado esperado, mude, use a criatividade, chame a atenção do seu filho para coisas complementares àquela tarefa “chata” que ele não quer fazer. Faça ele enxergar além daquilo, faça ele ver os benefícios posteriores.

Para finalizar, reflita sobre a seguinte afirmação:
Estudos mostram que o caráter de uma pessoa se forma dos 3 aos 7 anos de idade. Isso quer dizer que, se ela teve bons exemplos e os assimilou, dificilmente mudará no sentido contrário, pois foi capaz de guardar os valores dentro de si.

Você já parou para pensar porque existem tantas pessoas desonestas no mundo? Onde elas aprenderam esses valores tão distorcidos?

Será que os pais desses adultos desonestos, mesmo sem intenção, não são os mesmos pais que ensinaram a chantagear, a ameaçar, a sempre esperar algo em troca quando esses adultos eram crianças?

Lembre-se: não prometa coisas que não irá cumprir. Não ameace. Não minta. Não intimide. Não mande. Apenas convença de maneira inteligente e eficaz.

Olá,

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